
A tarde cinza era quase um reflexo de mim mesma. Mas chovia, e eu cheguei num ponto em que não sei nem chorar - daí aprendo a gostar de vomitar, porque é uma forma de chorar, como ela me leu num conto de C. F. Abreu enquanto eu puxei (mais) um cigarro do maço e fiquei encarando as palavras no ar, com a fumaça.
Lembrei de um punhado de coisas que tinha esquecido. Da sensação absurda de não haver um resquício de serotonina no meu corpo inteiro. Do grande vazio que eu sentia. E corrigi: do grande vazio que sinto.
Deve haver algum sentido. E se do alto das minhas 81 encarnações não houver sentido nenhum em 81 vidas, em 81 desilusões consecutivas, em 81 quedas e pior, 81 recomeços?
Sabe, o mais triste é ter esperança.
Tem uma parte do jogo em que fica bem você desistir, e admitir que perdeu. Pronto, perdi. É importante ser bom perdedor. Como eu, desistindo desse post sem coerência nenhuma.
Era tarde, era cinza, era inverno.
Como São Paulo de outra época, garoava, e eu esperava o bonde na estação de metrô.
Como em dias imemoráveis, como com olhos de outros tempos, eu enterrava minha misantropia no asfalto molhado, que não sabia absorvê-la, porque é concreto, e acabava refletindo em mim as minhas dores eternas.
Quem é que não tem dor?
Ela é tudo que tenho; é quase uma obrigação que eu goste dela.



